domingo, 4 de setembro de 2011

Farisaísmo e o fantasma do quarto 23



Iniciei minhas atividades no segundo ano da faculdade de teologia com a proposta de estagiar num lar para idosos todas as terças feiras pela manhã. O trabalho é simples, de capelania, através do qual eu e mais duas colegas somos desafiadas no contato com as mais diversas necessidades humanas.
Dentro desse ambiente, não pude deixar de notar painéis eletrônicos espalhados pelas dependências principais do lar. Já em meu segundo dia de estágio, percebi que todos piscavam continuamente o número 23. Ao indagar o significado disso, foi-me dito que a finalidade dos painéis era de avisar um morador com necessidades urgentes, chamando enfermeiros. Como o número permanecia piscando por mais de meia hora e nada se fazia, decidimos ir verificar a necessidade do morador do quarto 23.
Qual não foi a nossa surpresa quando nos deparamos com um quarto trancado, vazio. Lá estava uma incógnita. Já que não havia ninguém, por que o painel permanecia piscando esse número?
Interessante notar que a nossa conclusão foi imediata: havia um mal contato nos fios, que mantinha o painel conectado ao quarto 23. Depois virou piada entre as estagiárias, o ‘fantasma do quarto 23’, que usamos com algumas enfermeiras mais tarde, para descontrair.
No mundo natural é muito fácil nos desvencilharmos das aparências para buscar uma explicação mais aprofundada para determinada situação. Parece que o mundo está muito melhor preparado para ir além da superfície do que muitos cristãos.
Jesus abordou o problema da superficialidade em Mateus 23, quando confrontou as multidões a respeito da religiosidade:
1 Então falou Jesus às multidões e aos seus discípulos, dizendo:
2 Na cadeira de Moisés se assentam os escribas e fariseus.
3 Portanto, tudo o que vos disserem, isso fazei e observai; mas não façais conforme as suas obras; porque dizem e não praticam.
4 Pois atam fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens; mas eles mesmos nem com o dedo querem movê-los.
5 Todas as suas obras eles fazem a fim de serem vistos pelos homens; pois alargam os seus filactérios, e aumentam as franjas dos seus mantos;
6 gostam do primeiro lugar nos banquetes, das primeiras cadeiras nas sinagogas,
7 das saudações nas praças, e de serem chamados pelos homens: Rabi.
8 Vós, porém, não queirais ser chamados Rabi; porque um só é o vosso Mestre, e todos vós sois irmãos.
9 E a ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque um só é o vosso Pai, aquele que está nos céus.
10 Nem queirais ser chamados guias; porque um só é o vosso Guia, que é o Cristo.
11 Mas o maior dentre vós há de ser vosso servo.
12 Qualquer, pois, que a si mesmo se exaltar, será humilhado; e qualquer que a si mesmo se humilhar, será exaltado.
13 Mas ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque fechais aos homens o reino dos céus; pois nem vós entrais, nem aos que entrariam permitis entrar.
14 [Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque devorais as casas das viúvas e sob pretexto fazeis longas orações; por isso recebereis maior condenação.]
15 Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque percorreis o mar e a terra para fazer um prosélito; e, depois de o terdes feito, o tornais duas vezes mais filho do inferno do que vós.
16 Ai de vós, guias cegos! que dizeis: Quem jurar pelo ouro do santuário, esse fica obrigado ao que jurou.
17 Insensatos e cegos! Pois qual é o maior; o ouro, ou o santuário que santifica o ouro?
18 E: Quem jurar pelo altar, isso nada é; mas quem jurar pela oferta que está sobre o altar, esse fica obrigado ao que jurou.
19 Cegos! Pois qual é maior: a oferta, ou o altar que santifica a oferta?
20 Portanto, quem jurar pelo altar jura por ele e por tudo quanto sobre ele está;
21 e quem jurar pelo santuário jura por ele e por aquele que nele habita;
22 e quem jurar pelo céu jura pelo trono de Deus e por aquele que nele está assentado.
23 Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, e tendes omitido o que há de mais importante na lei, a saber, a justiça, a misericórdia e a fé; estas coisas, porém, devíeis fazer, sem omitir aquelas.
24 Guias cegos! que coais um mosquito, e engulis um camelo.
25 Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque limpais o exterior do copo e do prato, mas por dentro estão cheios de rapina e de intemperança.
26 Fariseu cego! limpa primeiro o interior do copo, para que também o exterior se torne limpo.
27 Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas por dentro estão cheios de ossos e de toda imundícia.
28 Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas por dentro estais cheios de hipocrisia e de iniquidade.
29 Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! porque edificais os sepulcros dos profetas e adornais os monumentos dos justos,
30 e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos sido cúmplices no derramar o sangue dos profetas.
31 Assim, vós testemunhais contra vós mesmos que sois filhos daqueles que mataram os profetas.
32 Enchei vós, pois, a medida de vossos pais.
33 Serpentes, raça de víboras! como escapareis da condenação do inferno?
34 Portanto, eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas: e a uns deles matareis e crucificareis; e a outros os perseguireis de cidade em cidade;
35 para que sobre vós caia todo o sangue justo, que foi derramado sobre a terra, desde o sangue de Abel, o justo, até o sangue de Zacarias, filho de Baraquias, que mataste entre o santuário e o altar.
36 Em verdade vos digo que todas essas coisas hão de vir sobre esta geração.
37 Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas, apedrejas os que a ti são enviados! quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e não o quiseste!
38 Eis aí abandonada vos é a vossa casa.
39 Pois eu vos declaro que desde agora de modo nenhum me vereis, até que digais: Bendito aquele que vem em nome do Senhor.
Quando Jesus aborda os princípios que agradam a Deus, deixa bem claro que a superficialidade da religião é inútil diante do verdadeiro arrependimento. Sinais externos piscando necessidades da carne, fazendo barulho e chamando a atenção, não representam um verdadeiro relacionamento com Deus e comprometimento com a verdade.
À medida em que nos aproximamos cada vez mais da vida que há em Cristo Jesus e nos submetemos a conhecer cada vez mais Suas Palavras (sem achar que nosso conhecimento básico e superficial vai nos projetar automaticamente para dentro do Reino de Deus), vamos sendo trabalhados em nosso caráter e prioridades.
Precisamos parar de julgar as pessoas pelo que achamos certo ou errado, precisamos parar de piscar nossos sinais de alerta quando uma imagem não se encaixa em nosso padrão de religiosidade. Precisamos deixar de lado essa constante mania que temos de rotular aqueles que nos rodeiam e parar de construir muros ao invés de derrubá-los.
A Igreja é para todos, assim como Jesus veio para os doentes e pecadores. O que a Bíblia deixa em aberto não deve ser a base de nossa fé e relacionamento mútuo. Somos chamados a desmascarar esse fantasma da religiosidade em nosso meio.
Um sepulcro caiado (pintado de cal – branquinho por fora, mas cheio de podridão por dentro) é como o fantasma do quarto 23 – aparenta uma coisa, mas não passa de um quarto vazio com problemas técnicos.

Angela Natel - 09/08/10

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